Exercício Físico e Ostomia

Diz a minha avó, mulher de 94 anos com uma ostomia intestinal, que “parar é morrer”. Não queremos as nossas pessoas ostomizadas paradas, queremo-las em movimento, com energia, com as capacidades físicas e cognitivas que lhes permitam, diariamente, lidar com esta nova condição de vida, mas também viverem o dia-a-dia com a maior naturalidade, com satisfação e bem-estar.

O exercício físico é algo que não passa pela cabeça da maioria dos doentes ostomizados, principalmente no início. Contudo, o exercício físico torna-se fundamental em todas as fases da presença de uma ostomia, até antes da cirurgia que lhe dá origem. Tem, obviamente, de ser um exercício acompanhado e adaptado à pessoa, realizado de forma gradual e adaptado à condição física e à fase clínica em que se encontra, com apoio e vigilância regular pelos profissionais de saúde que a acompanham.

Há estudos que comprovam que, após uma cirurgia da qual resulta uma ostomia existe uma tendência enorme para a inatividade e um medo de consequências negativas da prática de exercício1.

O exercício físico proporciona benefícios não só na preparação e recuperação para a cirurgia da qual resulta uma ostomia de eliminação intestinal, como contribui para uma melhor circulação sanguínea, melhor funcionamento intestinal, facilita o processo de cicatrização na fase pós-cirurgia, reduz o risco de complicações cardiovasculares, respiratórias e motoras, contribui para controle do peso, para o fortalecimento muscular e reforço do sistema imunitário, o que já se torna benéfico na fase de reabilitação pós-ostomia.

Para além destes benefícios, o exercício físico contribui para uma melhor sensação de bem-estar e melhor autoestima, com benefícios ao nível psicológico e social.

A sarcopenia* tem vindo a aumentar, nomeadamente nas idades mais avançadas, é importante não só avaliar os indicadores evidentes da presença deste estado de doença, mas também iniciar uma intervenção precoce. Desta intervenção emerge a importância de uma prática regular de exercício físico, aliado a um equilibrado estado nutricional.

Alguns dos exercícios recomendados na literatura e pelos profissionais de saúde que lidam de perto com estas pessoas são a caminhada, corrida, bicicleta, natação, hidroginástica, golfe, ténis, ténis de mesa, yoga, pilates, ginásio com moderação e com ajuda de profissionais competentes, com início gradual e acompanhados de períodos de repouso, uso de vestuário e calçado leve e confortável, boa hidratação antes, durante e após o exercício.

Exercícios em grupo podem ser recomendados para melhorar a socialização, contudo, exercícios mais violentos ou de maior contacto, como por exemplo o futebol poderá não ser uma boa opção, pelo risco de traumatismo e lesões no estoma. Mas, se for desejo da pessoa realizar este tipo de desporto, poderá fazê-lo desde que use roupa adequada e de suporte (exemplo cinta de apoio abdominal), optando por um dispositivo (saco) flexível e confortável.

A prática de exercício físico é importante não só para o bem-estar físico e mental, mas também para o fortalecimento da musculatura abdominal e pélvica, com benefícios documentados na prevenção de complicações, nomeadamente no desenvolvimento de hérnias abdominais (ex: hérnia parastomal) e incontinência fecal (perda involuntária de fezes pelo ânus). Geralmente as complicações surgem pela fragilidade em geral, nomeadamente da musculatura física e do estado emocional.

A dúvida que, não raras vezes, surge é “quando posso ou devo iniciar a prática de exercício?”

Normalmente recomendamos que a retoma do exercício físico deve acontecer após remoção dos agrafos ou pontos de sutura da ferida ou feridas cirúrgicas - 10 a 12 dias após a cirurgia. Se o exercício de eleição envolver a parte abdominal, deverá respeitar um período de espera até iniciar o exercício de 4 a 6 semanas após a cirurgia. Claro que, este período, depende do tipo de cirurgia realizada, do tipo de pessoa e do tipo de exercício que pretende realizar. Se a técnica cirúrgica for minimamente invasiva (por laparoscopia), poderão iniciar o exercício físico mais cedo sendo que, determinados exercícios iniciam-se numa fase muito precoce, ainda durante o internamento (1º dia de pós-operatório), independentemente da técnica cirúrgica, que é o exemplo da caminhada, principalmente nas instituições que seguem as recomendações do ERAS protocol**.

Um aspeto que se revela preocupante é que alguns dos, ainda que escassos, estudos que abordam esta temática, retratam que os indivíduos ostomizados investigados não se recordam de receber algum conselho sobre exercício ou atividade física pela sua enfermeira e/ou cirurgião, mostrando-se, portanto, uma área um pouco negligenciada na investigação e no acompanhamento de pessoas ostomizadas1.

A nossa experiência enquanto profissionais de saúde que lidam de perto com pessoas ostomizadas e de acordo com a escassa literatura existente, parece-nos que o exercício físico é um forte aliado do bem-estar e da saúde do corpo e da mente. Na presença de uma ostomia intestinal, ao contrário do que se possa pensar, o exercício vem reforçar positivamente a recuperação, contribuindo para uma melhor qualidade de vida aos vários níveis (físico, psicológico, social e espiritual).

Uma dica importante é aprender a “escutar” o corpo, respeitar o tempo de atividade e o tempo de repouso, perceber o que nos faz sentir bem e, desfrutar do melhor da vida.

 

 

 Enfermeira Liliana Miranda

Enfermeira Estomaterapeuta no CHTMAD (Centro Hospitalar de Trás-os-Montes e Alto Douro); Perita em Estomaterapia pelo WCET

Enfermeira Especialista e Mestre em Enfermagem Comunitária pela UTAD

Doutoranda em Enfermagem na UCP

 

 

Bibliografia:

  1. Russell, S. (2017). Physical activity and exercise after stoma surgery: overcoming the barriers. British Journal of Nursing26(5), S20-S26.

 

 

* – perda generalizada e progressiva de massa muscular

** – Enhanced Recovery After Surgery (Otimização da Recuperação Pós-Operatória)

 

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